top of page
Group 1000003269.png
Group 1000003269.png

Além da tela: cinema dá visibilidade e redefine protagonismo de pessoas com esquizofrenia

  • Foto do escritor: Instituto IMPAR
    Instituto IMPAR
  • 4 de out.
  • 3 min de leitura

Por Juliano Lueders


Foto horizontal de Juliano Lueders. Ele é um homem de meia-idade, alto, de pele clara e olhos esverdeados. Seus cabelos são curtos e castanhos e ele tem bigode. Ele usa um óculos de armação redonda preta, uma blusa rosa clara e sorri para a foto. O fundo é preto.


Qual foi a última vez que você foi ao cinema e assistiu a um filme com o elenco formado por pessoas com transtorno mental, deficiência e/ou neurodiversas? Se a resposta foi “nunca”, saiba que você não está sozinho(a). Também faço parte desse grupo. Mas estou determinado a encontrar formas de mudar tal realidade, e rápido.


Produzir cinema no Brasil permanece um desafio que ultrapassa a dimensão artística. Mas falar de tudo o que envolve a produção de um filme, desde o surgimento de uma ideia até a distribuição nas salas de cinema ou streaming, vai ficar para outro momento. Aqui, meu foco é num ponto em que a área cultural brasileira já começa a se debruçar: a acessibilidade aos produtos artísticos e experiências culturais.


Hoje, é fundamental compreender a acessibilidade em suas múltiplas dimensões, para garantir o acesso pleno. Se você não entende muito bem do que estou falando, grave aí: a acessibilidade comunicacional diz respeito à tradução em Libras – Língua Brasileira de Sinais; legendas para surdos e ensurdecidos (LSE); e audiodescrição (AD), um recurso de tecnologia assistiva que permite a pessoas cegas e com baixa visão – e outros públicos –, a percepção de imagens por meio de palavras.


A acessibilidade arquitetônica, por sua vez, abrange rotas acessíveis, rampas e espaços adaptados que asseguram conforto e segurança a todos. Por fim, a acessibilidade atitudinal refere-se a um acolhimento respeitoso e atento, criando um ambiente onde as pessoas se sintam bem-vindas e confortáveis a participar de todas as etapas do processo. As três dimensões são essenciais para começar a promover uma experiência verdadeiramente acessível.


Mas isso também se aplica ao cinema? Sim, pelo menos em teoria.


Editais culturais públicos e privados já exigem que projetos contemplem recursos que garantam a acessibilidade para esses públicos – historicamente negligenciados e que, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), representam cerca de 15% da população mundial. Então, já dá para entender que essas não são meras exigências burocráticas da Agência Nacional do Cinema (Ancine), a agência reguladora federal responsável pelo fomento, regulação e fiscalização do mercado audiovisual no Brasil. São, isto sim, ações afirmativas de respeito a grupos tradicionalmente deixados de fora da produção cultural mundial.


A acessibilidade no cinema vai muito além de uma adaptação técnica ou estratégias para ampliar mercados; é um convite para repensar mentalidades e práticas, para nos tornarmos mais humanos.


Então, me juntei a um grupo de artistas inquietos(as), como eu, e nos propomos, em vez de apenas incluir essas pessoas como espectadoras, colocá-las como protagonistas das histórias.


Foi esta proposição que motivou a criação do documentário “O que você sabe sobre mim?”, que será lançado em 2026 pela Futuro Coletivo Filmes, em parceria com o Instituto IMPAR. No filme, mostramos que o transtorno mental e a neurodiversidade são características de uma pessoa, não algo que define a pessoa. Através das lentes das câmeras do cinema, apresentamos o processo de trabalho de um grupo de teatro formado por pessoas usuárias dos serviços de saúde mental. Na história, os personagens refletem sobre si mesmos e o poder transformador que a arte tem nas suas vidas.


O processo tem sido enriquecedor. As filmagens revelaram algo surpreendente para mim: temos muito coisas mais em comum do que imaginamos e ainda sabemos muito pouco sobre essas pessoas que a sociedade rotula como loucas, incapacitadas.


No projeto, ainda não conseguimos montar uma equipe técnica neurodiversa e/ou com deficiência, por exemplo, mas seguimos firmes no propósito de ampliar esse alcance e promover uma mobilização social verdadeira, dando visibilidade a quem sempre foi colocado à margem.


Sim, é fundamental que cada um entenda o que é preciso fazer para construir, para já, um futuro no qual todas as pessoas sejam vistas, ouvidas e respeitadas.


Uma sociedade mais justa nasce de histórias que nos fazem enxergar o outro — e a nós mesmos — com mais humanidade. E o cinema é, sem dúvida, uma ferramenta poderosa para essa transformação.


Juliano Lueders é produtor audiovisual, diretor da Futuro Coletivo Filmes e associado do Instituto IMPAR.


Comentários


bottom of page